João Gabriel é doutorando em comunicação e investigador do Instituto de Pensamento y Cultura em América Latina (México).
Uma potência imperialista comandada por um lunático que reivindica ser o herdeiro de uma longa tradição quer mostrar seu poder militar para todo o planeta e esmagar qualquer foco de resistência. Poderia ser a síntese da política internacional estadunidense, mas é a descrição do novo filme de Star Wars. A saga que quando fundada refletia a utopia social-liberal do “mundo democrático” contra o “totalitarismo”, hoje serve de exemplo de como as forças alternativas têm que se comportar em casos como o do assassinato de Soleimani, general iraniano. Se você não fez uso de qualquer leitura bem fundamentada sobre a relação historicamente tensa entre Irã e Estados Unidos, assim como sobre a complexidade do Oriente Médio, simples, lembre-se de Star Wars para não falar bobagem!
Numa galáxia muito distante, as forças rebeldes têm somente um consenso: Palpatine e os Sith são do mal, ameaçam a existência na galáxia e o fato de existir um exército com capacidade de destruição de planetas é perigoso para todos. Não interessa se são ex-membros de sua força militar, se são monarcas em seus respectivos planetas, se são republicanos, mercenários ou pobres. O inimigo comum obriga a unificar-se e parar a poderosa frota imperial. O mesmo se aplica para o atual momento do nosso planeta. O Oriente Médio é o laboratório do que os Estados Unidos querem fazer com os países periféricos. Lá refinaram as táticas do “Contra”, tão utilizadas para deter o movimento revolucionário na América Latina; lá oscilam a destruição total de um país seja por bombardeio, seja por grupos paramilitares, seja por propaganda para transformá-los em vilões primitivos que não merecem simpatia por países “racionais” e por “defensores de direitos humanos”.
O regime iraniano não é flor que se cheire. O aiatolá e o regime teocrático mataram comunistas e dissidentes verdadeiramente revolucionários ao longo das últimas décadas. As questões das mulheres e da comunidade LGBT igualmente são traumáticas. Contudo, as bombas do terrorismo ianque não são “gay friendly”! Mulheres, população LGBT, serão mortas de igual maneira que fanáticos religiosos, e povo em geral, tudo pelas mãos do imperialismo. Na saga Star Wars não existe nenhuma relativização se há melhor paridade salarial na Estrela da Morte ou em uma comunidade Ewok. O fato de que os Jedis sejam uma seita não impede que a galáxia se alie a eles para derrotar o Império. A questão é simples, há que eliminar o inimigo central que pode destruir todos os que são oposição a ele. Devemos fazer o mesmo. Quando é para enfrentar os Sith Gringos e sua armada desproporcional, somos solidários com qualquer país do mundo.
No resto, é papel do campo progressista de cada país, especialmente das forças mais avançadas, pensar estratégias e táticas para superar as injustiças e as opressões internas de cada regime político-econômico, sendo possível e desejável uma atuação conjunta internacional como fizeram nossos antepassados comunistas. Que a “esquerda” dos Estados Unidos, ou simplesmente que a grande imprensa ocidental se preocupe com o fato de quase 40% da população norte-americana enxergar a homossexualidade como algo imoral[1], o que esclarece o fato de homossexuais serem proporcionalmente o setor com maior quantidade entre vítimas de crimes de ódio no país[2], além de diversos estados considerarem ilegal adoção de filhos por casais homossexuais. Que a esquerda brasileira saia da hipocrisia de comprar o discurso xenofóbico de que o mundo oriental é retrógrado e violento quando temos na vitrine ocidental (EUA) um crescimento de crimes de ódio motivados por intolerância religiosa e por um presidente que, assim como o Irã, utiliza da legítima fé do povo pobre para garantir sua popularidade. Que sejamos capazes de enfrentar os problemas do interior dos nossos países, mas sem perder a ótica do verdadeiro inimigo e da solidariedade incondicional e internacional contra qualquer tipo de ofensiva imperialista.
O inimigo é o império!
[1] https://www.statista.com/topics/1249/homosexuality/
[2] https://www.theatlantic.com/politics/archive/2016/06/the-extraordinarily-common-violence-against-lgbt-people-in-america/486722/