Os atos “contra” o Bolsonaro no dia 12 de setembro foram na verdade um grito dos neoliberais por um lugar ao Sol. Enquanto o Governo Bolsonaro estava bem, aplicando contrarreformas, com a Câmara nas mãos e brincando de ameaças à combalida democracia burguesa, estava tudo certo, era um mal necessário. Não por acaso todos os setores da direita que conduziram os atos do dia 12 eram base de apoio à Bolsonaro no segundo turno eleitoral de 2018. Agora, que se aproxima das eleições de 2022 e que Bolsonaro passa a ter chances reais de derrota, e sem qualquer candidatura reacionária ainda com força e viabilidade, os neoliberais berraram nas ruas por seu quinhão na conjuntura. Esses neoliberais economicamente em nada estão distantes do Governo Bolsonaro, ao contrário, o neoliberalismo é bolsonarista quando quer e o Governo Bolsonaro é plenamente neoliberal.
Há, contudo, a exceção de Ciro Gomes e do PDT, que respeitosamente por uma necessidade de espaço estão girando sua tática para ocupar o lugar da famigerada “terceira via”, um espaço de centro-direita. Podemos discordar da tática de Ciro, podemos inclusive apontar seus limites porque não há viabilidade para um programa (em tese) desenvolvimentista, como o levantado por ele, ter eco justamente nos ambientes neoliberais; porém, não podemos negar que seja uma tática honesta diante do fato de que Ciro e o PDT foram alijados (ou se auto-alijaram) do campo da esquerda tradicional, então dirigido pelo PT.
De qualquer modo, não temos problema algum com alianças táticas com setores à direita, tampouco à centro-direita, a História mostra que marxistas-leninistas devem ser habilidosos com isso. Além de que para vencer o Bolsonaro, é mais do que urgente, para aí sim começarmos a vencer o bolsonarismo, ampliar relações constituindo uma frente ampla contra o atual presidente. Acreditar fazer isso somente com a esquerda é pura ilusão.
Entretanto, é importante ver que o MBL na verdade age igual os Estados Unidos e o Reino Unido agiram na 2° guerra mundial: chegam para reta final disputando a liderança e fingindo que não têm nada a ver com o monstro que ajudaram a criar, e lógico chegam para impedir que a esquerda (à época URSS) possa eventualmente ganhar a guerra sozinha.
Por outro lado, Stalin e os líderes da URSS naquele momento não pouparam esforços na construção da amplitude, pois sabiam o quanto seria importante abrir outro front na Europa e como isso faria com que a guerra durasse menos tempo, e menos tempo de conflito significava mais soviéticos vivos e em segurança. A responsabilidade com vida das pessoas e com a própria continuidade do Estado Socialista soviético foi crucial para não se deixar levar por esquerdismos que, na verdade, apenas aumentariam as chances de vitória ou resistência dos próprios nazistas prolongando a guerra.
Agora, os atos do MBL são na verdade mais contra uma possível vitória capitaneada pela esquerda, que começa a se desenhar. Todavia, a amplitude que a entrada desse e de outros grupos de direita pode colaborar com um movimento nacional contra Bolsonaro, isolando de vez o bolsonarismo nas ruas, nas redes e nas urnas, considerada a força midiática desses grupos e a sua representatividade ante as elites dominantes, havendo setores dessas a sinalizar rompimento com Bolsonaro.
É importante notar, também, que os atos da campanha “Fora Bolsonaro”, da esquerda, foram muito vitoriosos em diversos aspectos, mas não conseguiram de forma contundente ampliar a campanha para a disputa de símbolos que o bolsonarismo se apropriou, tais como o verde e amarelo e a camisa da seleção brasileira. Lembrando sempre, o verde e amarelo deve ser popular, e não dos fascistas e não dos entreguistas que vendem o país dia sim dia outro também. Outro ponto importante de se destacar é que não conseguimos converter esse movimento e indignação para barrar a agenda bolsonarista no Congresso, por vários motivos.
Temos então que ampliar o “Fora Bolsonaro” para além da esquerda, utilizando muita habilidade na tática, ou seja, executando a ampliação sob o comando das forças populares e progressistas. Se isso acontecerá indo aos atos d chamados pela oposição de direita ou se acontecerá com essa oposição vindo ao ato da oposição de esquerda é uma questão de aplicação tática. O melhor caminho, evidentemente, era a construção de uma mesa de negociação entre todas as forças políticas e econômicas, neste momento, favoráveis à queda de Jair Bolsonaro.
Se Stalin topou o pacto de não-agressão germano-soviético para ganhar tempo; se Stalin depois uniu forças com os capitalistas que queriam o fim da União Soviética e que apoiavam os nazistas para justamente derrotar os nazistas; por que não podemos taticamente aliançar com setores de direita que, por motivos diversos, querem agora a queda de Jair Bolsonaro, por quê? A questão principal não é a falsa polêmica dos atos contra Bolsonaro, isto é, a polêmica vazia que discute se é correto ou não participar de atos com setores atrasados e reacionários em nome de uma pauta em comum muito maior, qual seja a queda de Bolsonaro. Mas, sim, como (quando, onde e em quais condições) construir um movimento amplo, uno, forte e coeso de derrubada de Jair Bolsonaro, limitado a essa única pauta, logo o suficiente para contemplar objetivamente todas as forças que desejam a queda do dito cujo. Do contrário é esquerdismo, ora doença infantil da qual não sofremos.
Guilherme Travassos é militante da Organização A Marighella – CPR (Coluna RJ).