Nicolas Farias (Estudante do Curso Técnico em Meio Ambiente da ETEC Getúlio Vargas)
O texto que se segue faz parte dos meus estudos sobre a questão ambiental, em particular como ela foi abordada dentro das experiências socialistas, nesse caso a ex-União Soviética durante as décadas de 30 e 40. Alguns teóricos marxistas preocupados com o colapso ambiental tendem a olhar para as experiências socialistas com grande sentimento de autofobia, na ânsia por um balanço crítico da história acabam “jogando o bebê fora junto com a água do banho”, nesse sentido os aspectos positivos e conquistas civilizatórias são relegados em busca de um socialismo ideal. Ao mesmo tempo e de certo modo entristecedor, existem aqueles que em defesa do nosso passado de lutas acabam não sabendo responder à altura os críticos e detratores, caindo assim em falsos argumentos como “essa não era uma preocupação relevante na época.” Pela forma didática e introdutória não pude me aprofundar em certos aspectos, mas as referências no final do texto são de grande valor para quem tiver interesse em se debruçar sobre o tema. Gostaria de agradecer a uma grande camarada e amiga, Alice Rodrigues, que me ajudou com a correção e pelos ótimos apontamentos, as insuficiências que permaneceram são de minha responsabilidade.
Devido ao seu exílio na Sibéria, Joseph Vissarionovich Stalin sentiu fortes dores musculares nas mãos e nos pés; havia suspeitas de reumatismo. Na primavera de 1923, Anastas Mikoyan (aos 27 anos e secretário do Comitê do Partido no norte do Cáucaso) interrogando-o sobre suas dores, aconselhou uma retirada em Sochi, onde supostamente os banhos sulforosos quentes possuíam efeitos curativos. Após frequentar a estação de águas anualmente de 1926 a 1930, passou a sentir uma melhoria relativa de suas dores, ainda que momentânea. Em 1931 visitou Tskhaltubo, região que viria a se tornar uma estação medicinal, recomendação do próprio Joseph por possuir “águas realmente notáveis”.
Após o suicídio de sua esposa em 1932, Stalin se mudou do Kremlin para Kuntsevo, próximo à Moscou, onde foi construída para ele uma dacha (casa de campo, em russo) no meio de um bosque.
Acometido pelo cansaço e pela tensão da segunda guerra, período em que chegava a trabalhar de 14h a 15h por dia, Stalin teve seu primeiro derrame no dia 9 de outubro de 1945. Segundo sua filha, Svetlana, foi após esse acontecimento que Stalin passou a dedicar mais tempo em caminhar ao ar livre:
“Meu pai passava horas perambulando pelo jardim, como se estivesse procurando um local tranquilo e confortável sem achá-lo. No verão, ele passava dias seguidos caminhando lá fora, e seus papéis oficiais, seus jornais e o chá eram levados a ele no parque. Era a sua ideia de luxo. Demonstrava seu saudável apetite pela vida, seu constante amor à natureza e à terra. Evidenciava também seu bom senso, pois nos anos mais avançados ele estava decidido a manter a boa saúde e viver mais tempo.”
Com efeito, em 1946 Stalin viaja para a Criméia, tendo suas primeiras férias desde 1937, prolongando-as por três meses. “Em 1949, um grande sanatório com vários prédios foi construído especialmente para ele à beira do lago montanhoso de Ritsa, na Abkhazia, permitindo-lhe passar vários meses por ano nas montanhas, 1.000 metros acima do nível do mar.”
Foi também nesse período do pós-guerra que teve lançamento o “Grande Plano Stalin para a Transformação da Natureza”. John Bellamy Foster, que passa longe da acusação de “stalinista”, afirma que “foi o maior plano de florestamento em toda a história até aquele momento”, o historiador russo Ibraev Guennadi aponta que o plano buscava o “combate à seca de grandes proporções através de plantações florestais de protecção dos solos da erosão, introdução de cultura forrageiras rotativas, construção de açudes e reservatórios de água.”
Certamente, a ecologia na União Soviética teve diversos avanços e recuos, que se entrelaçam com as contradições externas (cerco nazifascista e ameaça imperialista) e as contradições internas (crescente influência dos grandes proprietários de terras em resultado da NEP, acirramento das disputas partidárias envolvendo sabotagem, terrorismo e posteriormente os “grandes expurgos”), influenciando, desse modo, as decisões políticas no governo e dentro Partido.
A industrialização acelerada teve efeitos colaterais notáveis: desmatamento, poluição atmosférica, hídrica e contaminação do solo. Aliado a isso, a rápida expansão industrial soviética e o domínio do pseudocientista Trofim Lysenko sob a Academia de Ciências, culminou no expurgo e assassinato de grandes cientistas como Nikolai Vavilov e Alexei Stanchinsky, além de outros membros da Sociedade Russa de Conservação (VOOP, em sigla original). Por outro lado, áreas científicas como a climatologia e a silvicultura tiveram considerável avanço no mesmo período, destacando-se o conceito de biogeocenose, introduzido por Vladimir Sukachev em 1941. Também não se pode esquecer ou minimizar, que a vitória soviética sob o nazifascismo na segunda guerra só foi possível devido a industrialização acelerada, além de ter contribuído para uma grande mobilização social:
“O esforço de industrialização acelerada nos primeiros planos quinquenais foi acompanhado por massivos investimentos na formação de capacidades científicas e tecnológicas na URSS. (…) o poder soviético expandiu significativamente o financiamento da educação em todos os níveis, aboliu a cobrança de mensalidades no ensino, multiplicou o número de escolas técnicas, e promoveu ativamente o ingresso e a formação de novos quadros de origem operária e popular, mulheres e integrantes de minorias nacionais nas universidades.”
Um Stalin Desconhecido – novas revelações dos arquivos soviéticos (Zhores A. Medvedev & Roy A. Medvedev)
O plano de Stáline de transformação da natureza (Ibraev Guennadi)
O terceiro período da ecologia soviética e a crise planetária (John Bellamy Foster)
100 anos da Revolução Russa – Legados e lições (A teia de Tânato: da industrialização acelerada à encruzilhada da inovação no socialismo Soviético / Luis Fernandes)